sábado, 14 de março de 2015

A permanência no poder e a tragédia previdenciária

por Kildare de Medeiros Gomes Holanda[1]

O discurso novo se estabelece com velhas práticas na municipalidade. Há mais de três décadas Santa Luzia repousa sobre uma réplica de administração que não se renova, apenas repete fórmulas políticas desgastadas. Reúne a fragilidade de quem, sem projeto e planejamento estratégico, robustece a história apenas com a permanência. Permanecer: esse é o lema, porque de resto as consequências, sabe-se, repousa nos ombros frágeis da população. A última década administrativa fala com muita propriedade da falta de conexão com a moralidade, a eficiência e o caminho de bom resultado administrativo-democrático.
Descobre-se com o passar do tempo que o único projeto a ser executado são aqueles planejados e financiados pelo Governo Federal. Se a administração municipal caminhar politicamente com a Presidência da República, enaltece-a; se oposição, usa suas plataformas de planejamento para o município e escarnece quem está a frente do poder central brasileiro. Falta capacidade para avançar. A endogenia familiar política foi quebrada em algumas poucas administrações —, não pela capacidade técnica ou o reconhecimento lúcido da existência de outras inteligências valorosas no município de Santa Luzia; o “espaço ofertado” em mandato, sem a possibilidade da reeleição —, ocorreu para acomodar negociações políticas. Nas negociações houve sempre o descarte de antigos aliados para adequar um discurso que nunca foi o da paz social. Quando há candidaturas fora da família esta não existe pela valoração do nome apresentado, mas pela ameaça de ruína do poder instalado. Eis um problema político e como se não bastasse apenas este existem vários outros de ordem administrativa, os exemplos nessa (des)ordem se sucedem.
Em outros momentos da vida política — meados da década de 1990 —, pudemos dialogar sobre o problema previdenciário municipal, mais acerca da incapacidade administrativa em tentar resolver e fazer o “encontro de contas”, qual o real valor da dívida da Prefeitura Municipal de Santa Luzia (PMSL) ao Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos Municipais de Santa Luzia (IPSAL) — bem como o que a administração municipal, em nome do instituto, já saldou efetivamente dos vencimentos de aposentados e pensionistas. Precisamos de explicações e esclarecimentos urgentes acerca desse assunto. Até hoje nenhum administrador municipal convenceu e nem tão pouco foi convincente nas explanações públicas desde a criação do IPSAL. Vivem de renegociar essa dívida. E o que é pior: sem a mínima resistência da Câmara Municipal de Santa Luzia. Sem um debate sério e aprofundado no parlamento acabamos por padecer de um legislativo independente. E a competência fiscalizadora do legislativo mirim como atenderá suas funções constitucionais? A aprovação apressada de projetos de lei que aceitam essas negociações de dívida entre a PMSL e o IPSAL somente colaboram com o fosso financeiro do instituto; e o que é mais grave, contribui para a insegurança e o risco em produzir no futuro um colapso instantâneo no sistema de previdência municipal.
Na questão da previdenciária municipal resiste apenas uma impressão lógica: desvincular-se do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e criar um instituto próprio, para no mês em que a PMSL não conseguir efetuar o repasse obrigatório, então desconta-se no contracheque do servidor municipal e... o problema resolve-se depois. Será mesmo resolvido? Como ficarão todos aqueles servidores municipais de Santa Luzia que encontrarem dificuldades em receber suas aposentadorias no futuro? É preciso ter responsabilidade administrativa, pois o desconto sem o repasse representa um grande ato de ilegalidade comprovada, podendo responder civil e penalmente por atos dessa natureza. Décadas de políticas previdenciárias municipais que representam um perigo na vida de homens e mulheres que dedicaram suas vidas ao serviço público santaluziense. Se há uma negociação sistemática e recorrente tem-se a prova então de que está havendo uma apropriação indevida sem o repasse automático à previdência municipal, pois não cabe ao Executivo manejar autonomamente os valores do IPSAL. Senão qual o motivo para a existência de uma diretoria administrativa com a finalidade de gerir os recursos que são descontados nos contracheques dos servidores municipais e que deveriam ser repassados ao instituto de previdência municipal? Hoje o agente público municipal que não atua com zelo administrativo responde judicialmente e, se sentenciado, deverá suportar a carga de responsabilidade produzida com a ilegalidade praticada. A modernidade não suporta a impunidade.
Avançamos na administração pública em poucos aspectos, infelizmente muito menos por decisão política em prestar um serviço de qualidade e transparência aos santaluzienses, mas por exigências da lei que forçou a tomada de algumas medidas administrativas. Deve-se fazer uma Frente Permanente em Defesa do Patrimônio de Santa Luzia, reunindo um cem número de pessoas na luta pelos resgates necessários dos nossos mais caros valores: políticos, culturais e artísticos, econômicos e financeiros, administrativos, educacionais. Envolver todos numa construção coletiva esse é o desafio. Começar o diálogo internamente nos núcleos comunitários — desenvolvendo ações necessárias em defesa dessa mesma coletividade — e, dessa forma, evitarmos as soluções externas com um viés político autoritário. Assim, não há que temer o futuro, há que temer o silêncio.
Aproxima-se cada vez mais 2016, ano de eleições municipais, e já nos pegamos a assistir soluções políticas de candidaturas prontas. Já houve anos de escassez dessas candidaturas, mas agora é diferente. Os arroubos da conversa midiática digital apresentam nomes para ocultar outros. Qual o motivo de tanto silêncio para alguns nomes? É fácil entender a opção por membros da família. Vontade de permanecer, de ficar e tentar mostrar que só dá certo se for da “cozinha de casa”. Todos os outros nomes são descartáveis. Opção difícil numa democracia é sustentar que só um grupo político há mais de trinta anos é capaz de administrar. As eleições são decididas sob forte apelo econômico, pois ainda não vige a liberdade de escolha com base em outros critérios senão a força do dinheiro.
Afinal, paira uma constante dúvida: não sabemos ao certo se as escolhas nas urnas  obedecem a liberdade proporcionada pela democracia, ou se a democracia proporciona uma manobra de resultados com base no poder econômico. Entre cargos públicos de livre nomeação e exoneração e mandatos alcançados nas urnas, Santa Luzia ainda assiste a permanência de um poder centrado nas raízes familiares, cada vez mais incapaz em promover mudanças para assistir suas necessidades mais urgentes.
Derivada da temática previdenciária resta-nos analisar futuramente outras tantas áreas vitais para o município, tais como: educação e cultura, meio ambiente, agricultura, trânsito, infraestrutura, política habitacional, economia local, geração de emprego e renda, turismo, limpeza urbana e construção de um novo perfil político que abandone o “EU” para servir ao “NÓS”. Olhemos no plano geral quem ocupa os cargos mais graúdos da administração municipal e estadual —, e iremos entender porque é mais interessante uma política conservadora de velhas e ultrapassadas tradições familiares.

Nota: As informações contidas no texto é de total responsabilidade do autor Kildare de Medeiros Gomes Holanda. 


[1] Doutorando em Ciências Jurídico-Processuais na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (UC), Professor Assistente III da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), Jornalista Profissional formado pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Filiado ao Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Santa Luzia – Paraíba.